domingo, 24 de agosto de 2014

“TRATAMENTOS” E MUITAS COISAS MAIS!

“Exmo. Sr. Duque de Cadaval
Se meu nascimento, embora humilde, mas tão digno e honrado como o da mais alta nobreza, me coloca em circunstância de V. Exª me tratar por tu, caguei para mim que nada valho.
Se o alto cargo que exerço, de Corregedor da Justiça do Reino em Santarém, permite a V. Exª, Corregedor-Mor da Justiça do Reino, tratar-me acintosamente por tu, caguei no cargo.
Mas, se nem uma nem outra coisa consente semelhante linguagem, peço a V.Exª que me informe com brevidade sobre estas particularidades, pois quero saber ao certo se devo ou não cagar para V.Exª.”
Santarém, 22 de Outubro de 1795.
Pina Manique, Corregedor de Santarém.

Foi notícia a deliberação (por unanimidade!) da Assembleia Municipal (AM) de Torre de Moncorvo, do passado dia 27/6, em abolir os títulos académicos no seu seio.
Ufano, o respectivo Presidente (pelos vistos, este título ele mantém), engenheiro, perdão ex-engenheiro, digo, ex-engenheiro lá dentro e engenheiro (talvez) cá fora, de seu nome José Mário Leite, veio justificar a decisão na “óptica da democracia republicana e da Revolução Francesa, de onde saíram os princípios da Liberdade, Fraternidade, e Igualdade, passando todos os deputados a ser iguais.”
A gente já sabia que as novidades, antigamente, chegavam a Portugal – segundo diziam – com décadas de atraso; e mesmo tendo em conta que o ocorrido se deu em terras de Trás (quer dizer, atrás dos) – os – Montes, não deixa de pasmar – e isso sim seria a notícia – que a Revolução Francesa só agora chegue a Moncorvo, 225 anos depois!
Provavelmente já se esqueceram que os tais defensores da “Liberdade, da Fraternidade e da Igualdade” (paragem na escrita, para riso intenso), a quiseram exportar na ponta das baionetas e nos retalharam o país, o corpo, a fazenda e, até, a alma, entre 1807 e 1811 e deixaram umas sementes malditas, que nos ensanguentaram em guerra civil durante cerca de 100 anos (pausa para meditação profunda).[1]
Parece que ainda não acabou…
Mas, aparentemente, a AM não tem mais com que se entreter e gasta tempo com estes rodriguinhos, a não ser que o edifício da AM se tenha transformado nalgum templo de inspiração maçónica. Quem sabe?[2]
Só não entendo é porque em vez de se passarem a tratar por “deputados” e “vereadores” – outros títulos! – não se designam apenas por “cidadão fulano tal”; e se passaram a ser todos iguais, um não bastaria? Sempre se poupavam uns trocos…
A igualdade é uma das maiores mentiras postas a correr, pela simples razão de que somos todos diferentes.
A igualdade tem que ser vista e equacionada no respeito, consideração e justiça que cada ser humano deve merecer e não em querer transformar todos numa massa amorfa e indiferenciada, ou a querer tornar igual o que é naturalmente diferente (caso dos homens e mulheres).
Um título é uma diferenciação de habilitações que identifica melhor um determinado profissional. Que mal haverá nisso?
Será que o passo seguinte é o das pessoas passarem a ter vergonha do que conseguiram na vida?
Os títulos académicos não devem à partida ser adjectivados ou implicarem qualquer estigma ou preconceito. Mas, de facto, cada um dos seus titulares pode comportar-se relativamente a eles, num amplo espectro que vai da inveja à arrogância, passando pela vaidade.
Tais comportamentos têm a ver com a maneira de ser de cada um e não com o grau académico ou profissão que ostentam.
E o que é realmente importante não é o grau académico nem se há ofícios bons ou maus, melhores ou piores. O que interessa é saber se há bons ou maus profissionais.
Mas, enfim, em vez de se assumir tudo isto, naturalmente, gosta-se é de arranjar confusão e sarna para se coçarem…
O resultado tem sido o cada vez maior nivelamento, por baixo, tendo como consequência a imbecilização da sociedade e a menorização do ser humano.
*****
Outros exemplos têm vindo a medrar, desde há muito, como é o caso de jornalistas da Rádio e Televisão estarem sempre a forçar o “tu cá, tu lá” com o público, entrevistados, concorrentes a concursos, etc., sem que até hoje se tenha ouvido alguém colocar o jornalista no seu sítio, numa cobardia parola de não quererem parecer “démodés” mas antes muito modernaços; a prática de entrarmos num estabelecimento comercial qualquer, tratarmos o empregado por “senhor” e recebermos em troca um “você”; a de dizermos “bom dia” e ecoar o silêncio, mais a recente moda, possivelmente iniciada nos “call centers”, de tratarem os indígenas por senhor, seguido do primeiro nome, quando costume antigo sempre tratou os portugueses pelo apelido, reservando o nome próprio para a família próxima e a amiga intimidade.
Para já não falar nos pais que se querem assumir como “amigos” dos filhos, como se ser pai fosse ser inimigo dos mesmos…
Toda esta prática desregrada tem levado, não a uma informalidade saudável, uma franqueza de atitudes, ou a uma lealdade de relacionamento, mas sim a um relaxamento rasteiro e sem nível nas relações de trabalho, na educação, cortesia, e em todas as instituições, a começar pela escola, e já há muito atinge as próprias Forças Armadas e de Segurança.
A coisa arrisca-se a ficar fora de controlo e acabar tudo à chapada, pois onde não há regras a tendência imediata é voltar à lei da selva.
Os professores da maioria das escolas e Universidades que o digam.
Até nos hospitais militares houve uma tentativa – felizmente frustrada, até ver, apesar dos pecadilhos – de omitir os postos, alegando-se que ali só havia doentes, como se um doente perdesse o direito à sua personalidade jurídica ou passasse à categoria de número![3]
Por tudo o que disse e ficou por dizer, ninguém deve abdicar do tratamento a que tem direito, no mínimo porque o mesmo lhe deu muito trabalho a obter e aos outros não lhes custa nada…
A moda deste “relaxamento” social começou com a informalidade anglo-saxónica que, sem embargo, sabe distinguir o que é “bagaço” do que é “serviço – ao contrário dos latinos; teve um movimento uniformemente acelerado com os diferentes movimentos “hippy”, “pacifista”, “libertação das mulheres” e mais uns quantos “ismos” e explodiu com o “Maio de 68”, em França.
Entre nós entrou de supetão, quando as comportas que seguravam as águas se romperam em 1974/5.
O que aconteceu em Portugal, porém, foi mais grave não só pela rapidez e anarquia em que tudo se passou mas, também, porque para além das transformações políticas e sociais visava derrubar qualquer tipo de hierarquia, logo de autoridade.
Nada foi feito inocentemente, pois intentava-se criar sobre os escombros algo de radicalmente diferente: uma sociedade comunista, socialista, terceiro-mundista, maoísta, ou o raio que os partisse, o que só foi parado a 25 de Novembro de 1975.
Mas a tábua rasa da hierarquia e da autoridade manteve-se, porque servia por razões semelhantes a todas as forças políticas que despontaram e, sobretudo, para quem quis impor um jacobinismo serôdio, o laicismo e o relativismo moral. O que conseguiram.
Tudo isto facilitou o apoucamento e o controlo das instituições estruturantes da Nação e as manobras subterrâneas. Também não é por acaso ou incompetência, que nos últimos 40 anos não se conseguiu pôr de pé um Serviço de Informações minimamente credível.
Ora sem Autoridade – e esta não tem que ser adjectivada, simplesmente, existe ou não – nada se consegue edificar…
Resultou que todos os governos de que fomos servidos se limitaram a gastar e a vender o que havia e tudo o que construíram não foi com riqueza criada, mas com o dinheiro que pediram emprestado ou receberam da UE (e nunca houve almoços grátis).
Deixaram a sociedade à solta, tendo o cuidado de aspergir subsídios (enquanto foi possível), eleições e paz social, “oblige”.
Criaram uma mentira enorme, baseada na autocensura e na distorção da realidade, onde quem tinha um olho e má formação, foi roubando o que pôde.
E como tudo isto atingiu proporções inauditas, quase ninguém o quer ou pode admitir.
Resta a bancarrota que deixou de ser possível esconder.
Não estou a poupar nas palavras nem tenho receio de ser acusado de mentiroso.
*****
Mas voltemos ao “tratamento” para vermos como regredimos em termos civilizacionais e em educação.
Comecemos pela Igreja.
O Papa tem direito ao tratamento de “Sua Santidade”; um Cardeal a “Sua Eminência Reverendíssima”; um Bispo a “Excelência Reverendíssima” e um Padre a “Reverendíssimo”.
Quanto à realeza – cingimo-nos à portuguesa já que pelo mundo fora as designações variam – o monarca deve ser tratado por “Majestade” ou “Sua Majestade” e um Príncipe por “Vossa Alteza” ou “Alteza Real”.
Relativamente à Magistratura, um Juiz do Supremo Tribunal, vence o tratamento de “Colendo”; o do Tribunal da Relação é “Venerável” e o do Tribunal de 1ª Instância antecede de “Meritíssimo”. Já o Ministério Público tem “Procuradores”.
A Universidade fica-se pela designação de “Magnífico” dada ao Reitor, sendo os degraus académicos de “Professor Doutor” (com vários graus, e por extenso), para os Doutorados; “Mestres” para os detentores de um mestrado e de Dr. (sem ser por extenso), engenheiro, arquitecto, etc., em função das diferentes licenciaturas.
Já a Diplomacia reserva o tratamento de “Excelência” (por extenso) a Embaixadores e Ministros Plenipotenciários, e o de “Vossa Senhoria” para Encarregados de Negócios e Cônsules.
As coisas são assim e assim é que estão bem.
O problema é que tudo isto caiu em desuso e já quase ninguém quer saber de tais “peculiaridades pré-históricas”, ou sequer as conhece.
E as instituições, apesar de não as terem renegado, apenas usam o tratamento entre si (quando usam), e em discursos protocolares, numa espécie de circuito fechado e já só falta pedirem desculpa por o fazerem.
*****
Deixámos propositadamente a Instituição Militar para o fim.
Até 1974, o tratamento aplicado aos oficiais era o seguinte: Aspirantes, Subalternos e Capitães/1ºs Tenentes tinham direito ao tratamento de Vossa Senhoria a anteceder o posto, que já de si era acompanhado da palavra “Senhor” ou do característico “Meu”; os oficiais superiores venciam “Vossa Excelência”, bem como os oficiais generais; ao passo que “Sua Excelência” era reservado a Marechais e Almirantes.
Em 1977/8 – note-se que ainda funcionava o Conselho da Revolução, pelo que não houve aqui qualquer influência civil – a hierarquia militar deu um tiro nos pés (o que tem feito, infelizmente, amiúde), ao reformular o Regulamento de Continências e Honras Militares e retirou o direito à dignidade do tratamento a todos os oficiais, à excepção da atribuída aos oficiais generais, marechais e almirantes.[4]
As razões por que o fizeram nunca foram explicitadas (creio), mas tal explica-se por todas as vicissitudes entretanto vividas e de que ainda hoje não recuperaram.
Já a população transmontana merecia melhor sorte (embora a sorte dê muito trabalho), mas ainda está a tempo de aprender com o antigo – e abençoado – Corregedor de Santarém.

[1] Sem falar nas desgraças que nos aconteceram a partir de 1795 e no combate e perseguição que lhes tivemos que dar, para os correr de Espanha, e os perseguir até que se rendessem, o que só aconteceu em Toulouse, em 1814.
[2] E atenção, no areópago da “Loja” a hierarquia é severa: tem 33 graus e a cada um corresponde um “título”.
[3] A “grande reforma” dos hospitais militares já fez com que se misturassem oficiais, sargentos e praças no mesmo quarto…
[4] Regulamento actualmente em extinção por inanidade!

A CAUSA PRIMEIRA, ÚLTIMA E ÚNICA, DA CRISE

“Devo à Providência a Graça de ser pobre.”
A.O. Salazar [1]

Nós, os humanos, aprendemos pouco e tarde.
E quando sabemos algo que se aproveite, morremos.
Esta é uma das chaves para se entender o sempre presente conflito de gerações e para perceber a importância de preservar a Informação, o Conhecimento e o Saber (três coisas distintas), nos centros de Saber tradicionais: a Universidade, a Igreja, a Magistratura, a Diplomacia e a Instituição Militar.
No fundo conseguir ampliar, ordenar e arquivar toda a sabedoria que os avós passavam aos netos desde que a organização social não ia além dos clãs e tribos nómadas.
Uma das coisas que julgo ter aprendido foi que, entre a natureza humana – que não muda na sua essência ao longo dos séculos, por mais que isso possa doer ao Rousseau e seus discípulos – existe uma matriz que, grosso modo, funciona assim:
Dez por cento das pessoas porta-se sempre bem; outros dez por cento, portam-se sempre mal e os restantes oitenta por cento, portam-se bem ou mal, conforme. Conforme as referências em vigor e conforme o “pau e a cenoura” existentes (portas-te bem comes cenoura, caso contrário, levas com o pau…).
Dito de outro modo: muitas das pessoas só não se porta mal se forem devidamente educadas, forem dissuadidas e, ou, não tiverem oportunidade para isso![2]
Lembremos o que disse o cronista depois da morte do agora Santo, Nuno Álvares Pereira: ”Foi em seu tempo claro espelho de honestos costumes”; e dele dizia amiúde o próprio Rei D. João I, “ Que os bons costumes que havia em Portugal que o Condestável os pusera todos”.
Numa palavra, é necessário – e é uma luta de sempre – organizar a sociedade no sentido do Bem e no castigo do Mal. Para isso é preciso que haja boas referências (foi esse o maior legado de Cristo na Terra) ensiná-las e pô-las em prática.
A “prática” é corrigida e mantida por um adequado sistema de Justiça e uma activa consciência cívica que leve a uma aprovação ou censura social, saudável.
Toda esta arenga serve para dizer que aquilo que entendemos pela “crise” actual tem uma hierarquia de causas e a primeira é, justamente, moral, depois política e só a seguir vem a financeira as quais originam, em consequência, um desastre económico e social.
Ora como a evidencia da crise só ganha foros mediáticos com o que se passa no campo das finanças e a maioria das pessoas só se indigna quando lhes vão ao bolso (e, mesmo assim, poucos agem), as verdadeiras causas morais que influenciam a política e a sociedade, tendem a ser ignoradas e, até, tidas por incorrectas.
Daqui resulta atacarem-se os efeitos em vez das causas dos problemas. Ou seja, estes nunca se resolvem...

De facto o fulcro dos problemas no mundo ocidental, sobretudo após a queda do muro de Berlim, nada tem a ver com ideologias políticas – todas elas, aliás, já experimentadas e gastas, num caminho já feito pela Humanidade de que só resultaram guerras e desgraças; Direito Internacional – de que a ONU é apenas um arremedo sombrio; organização do comércio mundial – cujo principal organismo, a OMC, aparenta estar ao serviço dos tubarões da finança; enfim, com Justiça relativa ou a procura da Paz – os dois termos mais invocados em vão, desde a invenção da escrita!
O que se tem passado tem a ver quase exclusivamente com a avidez e ganância humanas que leva ao mau uso que se faz do dinheiro.
Neste particular, o dinheiro – essa extraordinária invenção que como todas as invenções podem ser bem ou mal utilizadas – serve para acumular riqueza, comprar bens (e consciências), etc., podendo tornar-se num dos mais maquiavélicos instrumentos do Poder.
O dinheiro cuja origem e história é ignorada por 99,9% da população – algo que estranhamente não se ensina quase a ninguém – passou a ser o alfa e o ómega de tudo. “Hélas”, o Deus Mamon!
O que faz bem jus ao aforismo latino de que “nenhuma cidade cercada resiste a um burro carregado de ouro”…
Na actualidade assiste-se a um verdadeiro conúbio e promiscuidade entre políticos e banqueiros, escritórios sonantes de advogados e lugares rendosos (quer públicos quer privados), que sequestraram o poder político através de uma teia de leis e compromissos que blindou o “sistema”, visando a sua perpetuação em circuito fechado.
E como se defende mentirosamente, que tudo se passa segundo as regras “democráticas”, eis que tudo passa a legal e legítimo. Uma verdadeira armadilha.
Na prática, porém, nada do que se passa visa o bem comum nem o governo da cidade. Visa o lucro desmedido, usura, controlo político – logo social e económico – e baseia-se na falta de escrúpulos, corrupção e muitas fraudes e outros ilícitos criminais.
Tudo envolto em secretismo e em “organizações” de que apenas se fala à boca pequena.
O poder político fica deste modo cativo e refém de interesses inconfessáveis e a Nação perfeitamente desprotegida e “escravizada”.
Como medida cautelar, não vá o diabo tecê-las, apaga-se e eliminam-se as Forças Armadas da face do país.
Como lapidarmente escreveu o Professor Pedro S. Martinez em artigo recente, “Quando os governantes são de mãos limpas, também os banqueiros têm dificuldade em sujar as deles”.
A teia que levou a este estado de coisas começou a ser tecida no mundo há mais de 200 anos, embora em Portugal só tenha sido implementada a partir dos anos 80 do século passado.[3]
Neste momento estamos completamente enredadas nela (a teia) e apesar da grande “débacle” só ter estalado a partir de 2008, ainda agora a procissão vai no adro.
E não iremos sair da crise senão pelos factores morais: pela instituição de valores e princípios que não sejam relativos nem relativizados, que imponham a supremacia do espírito sobre a matéria e tragam para a Política pessoas integras – de preferência que não queiram ser ricas e tenham a coragem (rara) de agradecer à Providência a graça de ser pobres.
Políticos – cuja primeira qualidade a exigir, é que sejam patriotas - que consigam elaborar uma Constituição simples, se ela for mesmo necessária – já repararam que a melhor constituição alguma vez escrita, são os 10 Mandamentos da Lei de Deus? – com poucos artigos, despida de ideologia e onde os deveres estejam à frente dos direitos e onde estes derivem do cumprimento daqueles.
E onde um modelo jurídico, que dela decorra, permita meter em prisões adequadas (não hotéis de três estrelas), os muitos “Madoff” que por aí pululam, de modo a fazer do sermão do bom ladrão, do eterno Padre António Vieira, um resquício do passado: “Não são ladrões apenas os que cortam as bolsas. Os ladrões que mais merecem este título são aqueles a quem os Reis encomendam os exércitos e as legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais, pela manha ou pela força, roubam e despojam os povos.
Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam correndo risco, estes furtam sem temor nem perigo.

Os outros, se furtam, são enforcados; mas estes furtam e enforcam.”
Deixo à consideração dos leitores se será possível fazer tudo isto, democraticamente.
Isto é, se conseguimos convencer a maioria dos 80% da população a querer comportar-se dessa maneira.


[1] “O meu depoimento”, discurso proferido a 7 de Janeiro de 1949.
[2] Lembro o ditado: “A ocasião faz o ladrão”.
[3] Sem embargo do que se passou a partir das invasões francesas e suas consequências, que quase destruíram o país e a que só a reforma financeira de 1928, começou a por cobro. Com êxito.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

A.J. JARDIM, LEVIANDADES, OU COMO NÃO SE DEVE FAZER POLÍTICA EM PORTUGAL

“Passámos a grande ilha da Madeira
Que do muito arvoredo assim se chama,
Das que nós povoámos a primeira,
Mais célebre por nome que por fama”.
Camões, Canto V, 5.

O Dr. Alberto João Jardim (AJJ), usando da palavra na habitual “festa/comício” do Chão da Lagoa, no passado dia 30 de Julho, pariu uma catilinária contra o que ele definiu, sem explicar, de “Estado Português Unitário” e usou, mais uma vez, de demagogia barata sobre os “poderes” de Lisboa.[1]

Não demos conta que algum órgão do Estado ou força política lhe tenha respondido ou actuado e nenhum comentador, comentou…

Fazem-no, possivelmente, na esperança (vã) que ele se cale ou fique a falar sozinho. Outros porque julgarão que ele é tolo e não vale a pena gastar sebo com tão ruim defunto.

Fazem mal.

As razões são simples: há coisas por demais importantes que não devem ser deixadas passar em claro. É o caso, e AJJ também não é propriamente o 4º secretário de uma agremiação de bairro.

Por outro lado AJJ está longe de ser tolo. Estamos até em crer, que mesmo debaixo da influência de umas quantas “ponchas”, ele sabe perfeitamente o que diz e pensa o que diz.

A verdadeira razão porque não o criticam, porém, não é essa – note-se que a chamada “esquerda” está sempre na 1ª fila do ataque a Jardim e sobre este âmbito aos costumes nada diz. A coisa é mais profunda e tem origem na herança “vinte cinco abrileira” e na agonia apóstata da “Descolonização”.

Até agora nenhum “filho d’algo” se demarcou publicamente do discurso oficial, nem tentou emendar o que mentirosamente vem escrito nos livros “oficiais”, sobre os quais o Ministério da Educação (que nem instrução ministra…), obriga os nossos filhos e netos a fazer exame – só para referência claro!

De facto quando oficialmente está instituído que os povos das “colónias”[2] tinham direito à autodeterminação (que nunca foi realizada) e à independência (que até hoje não lograram) – mesmo que soprada de fora – e a maioria dos portugueses que queriam manter a secular Nação incólume, não tinha o direito sequer a lutar por isso, está tudo dito!

Pior, quando alguns daqueles da “geração mais bem preparada” (deixa-me rir), que nos passaram a governar, ignoram por completo, ou fazem por ignorar, e confundem autodeterminação com substituição de soberanias e neocolonialismo, e não sabem destrinçar o termo “Colonização” de “Colonialismo”, o que se pode esperar?

Como se podem opor a que um vicioso qualquer possa vir bolsar as baboseiras “jardínicas” quando a Madeira está na mesmíssima posição que S. Tomé e Príncipe antes da independência apenas com a diferença – para o caso irrelevante – de que a pigmentação da pele da maioria dos São Tomenses é substancialmente mais escura do que a dos conterrâneos do agora faltoso Conselheiro de Estado (será que nem ao menos aí o criticam?).

Sim, sim, AJJ é Conselheiro de Estado, mas acha que não tem direito a nada nem lhe ligamos nenhuma…

AJJ queixa-se da Constituição? Também eu e muitos mais. De facto a CR está errada e mal escrita, em muitos aspectos, mas naquilo de que agora se queixa o político há mais tempo em exercício, está até escorreita!

Bom, mas o coitado não quer pertencer a um estado unitário, quererá pertencer a quê, então?

A um estado “partido”? Um estado “fragmentado”? Um estado “assim - assim”, ou apenas a um estado patético que é o estado da figura triste, apesar de florida, a que AJJ aparenta ter chegado?

Vejamos, o Estado é a Nação politicamente organizada; e unitário refere-se à unidade política de um país. Ora é evidente que AJJ ao dizer que não quer pertencer a um estado unitário está a dizer que não quer pertencer à mesma Nação.

Ou será que AJJ como Presidente de um órgão que não serve em rigor para nada - a não ser para arranjar clientelas e esbanjar dinheiros públicos - quer simplesmente fazer o que lhe der na realíssima gana e não ter responsabilidades ou ser criticado; e que as consequências negativas do que faz sejam pagas pelos outros, leia-se Açorianos e Continentais?

Não lhe chega uma boa descentralização?

E o Arquipélago da Madeira também quer ser unitário? Os de Porto Santo querem aturar o “colonialismo” dos “cubanos” da Madeira? E as Selvagens que estão quase tão longe do Funchal como Lisboa, também não terão direito a uma delegação da Assembleia Regional?

O que é que AJJ quererá fazer que o governo “unitário” não deixa? Quer que a gente lhe compre a banana a cinco euros e lhe revenda o gasóleo a 20 cêntimos?

Quer impedir a GNR de actuar na sua terra, por razões que só podemos imaginar?

Ou quer que seja o governo regional a mandar no central?

Diga-me Dr. AJJ, o que é que o faz pensar que tem mais direitos do que os habitantes do Minho?

Veja se atina!

Estamos cheios de aturar desconchavos políticos e também de iluminados muito democráticos que defendem que todas as opiniões são respeitáveis.

É mentira, muitas não o são – defender a pedofilia, por ex., não é respeitável (embora não esteja longe de vir a ser legal…) – e algumas merecem, quando não exigem, umas bengaladas!

AJJ já devia, há muito tempo, ter sido objecto de um processo, ao abrigo do artigo 308 do Código Penal. Mas parece que a PGR não está para aí virada.

Tão pouco os restantes órgãos do Estado com maiores responsabilidades.

O PR assiste a tudo assobiando para o lado – parece até ter medo do personagem; os governos, cheios de telhados de vidro e conivências de ofício partidário, evitam pisar-lhe os calos; os políticos de um modo geral são farinha do mesmo saco e da manjedoura comum; os chefes militares há muito que não existem e já nem as tropas os conhecem; os diplomatas andam escondidos no receio da própria sombra, alegando discrição; a Universidade virou negócio e campo de lutas ideológicas e de influência, onde a maioria dos alunos anda ao “Deus dará” tirocinando em muito álcool, sexo e rock e pouco estudo pelo meio (fora o que designam por “praxes”), etc..

Os comentadores esfregam as mãos, pois são casos destes que lhes mantêm o filão inesgotável e as notícias são sempre bem - vindas, pois ajudam ao negócio da venda de papel, som e imagem dos “média”.

Assim vamos vivendo.

Parece restar apenas ser um cidadão ou grupo de cidadãos, a fazer queixa das atitudes antipatrióticas e seccionistas de AJJ.

A cena carnavalesca, também ocorrida no Funchal, com os encapuzados a imitarem a “ETA”, é bem o retrato de como a vida política e social se degenerou no nosso país.

O João G. Zarco, o Tristão V. Teixeira e o Bartolomeu Perestrelo, descobridores e povoadores do Arquipélago, que Camões cantou, bem mereciam melhores descendentes.

Dr. AJJ não vou ser tão radical como o seu colega de Partido (lá está outra coisa que não é unitária…) – e que rico Partido, sim senhor – que por um acaso do destino ocupa temporariamente o cargo de PM, e sugerir-lhe que emigre.

Limito-me apenas a mandá-lo cavar semelhas para o Pico do Areeiro. Sempre lhe refrescava as ideias.


[1] Presume-se que se estivesse a querer referir ao artigo 6º da Constituição.
[2] Que, por acaso, só se chamaram colónias entre 1920 a 1926 e entre 1930 a 1951, por modismo da época, tendo sido ao longo dos séculos conhecidos também, como “Praças”, “Fortalezas”, “Estabelecimentos”, “Feitorias”, “Presídios”, “Capitanias”, “Domínios”, “Conquistas”, “Províncias”, “Estados” e até, “Reinos”…

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

MARCELINO DA MATA, COMBATENTE PORTUGUÊS, HERÓI ESQUECIDO

Entre o universo dos portugueses eu não serei o mais creditado para falar sobre o nosso Marcelino da Mata (MM) – permitam que o trate assim.

Peço que essa falha seja relevada pela vossa caridade cristã e também pelo facto do meu atrevimento ser fundado em boa mente.

Só estive com MM duas vezes, a primeira foi num encontro de “malfeitores” ali para os lados de Samora Correia; a segunda foi no Porto, em que o agora homenageado foi convidado de honra num encontro patriótico de angariação de fundos para a construção de um monumento aos combatentes do Ultramar, na Invicta. Eu fui o orador no evento.

“Malheureusement”, como diriam os franceses, a segunda cidade do País continua a ser um dos poucos municípios portugueses onde está por edificar tal monumento…

De tudo isto decorre não poder afirmar conhecer MM como pessoa, tão pouco aquilo que ele pensa.

Mas sei, de ciência certa, que o Tenente Coronel do Exército Português, Marcelino da Mata, foi um extraordinário combatente, um guerreiro, na verdadeira acepção da palavra e que honrou, até hoje, a sua condição de português de lei.

E não precisou para isso de possuir um alto grau de formação nem de nascer em berço de ouro.

É sobre tudo isto e o seu significado, que gostaria de dizer mais umas palavras.

O facto de estarmos a homenagear uma pessoa como MM – uma coisa que o Exército Português e outras “entidades” se têm esquecido injusta, mas muito convenientemente de fazer – é a prova provada de que as nossas últimas campanhas no Ultramar Português representaram uma guerra justa e que o grande projecto de expansão portuguesa, iniciado em 1340 e levado a cabo pela Ordem de Cristo, de inspiração Templária e sob a égide do Culto do Espírito Santo, estava certo e representou – e não deixou ainda de representar – uma das ideias mais grandiosas e esclarecidas que jamais ocorreram na Humanidade.

Daí que nós estamos aqui reunidos em fraternidade – que é a expressão mais elevada do antirracismo – em perfeita camaradagem – que só os combatentes verdadeiramente entendem – um negro, entre tantos brancos, de vários credos religiosos e ideológicos, mas unidos pela chama do patriotismo Lusíada, a qual se levantou acima do comum dos povos ao ponto de, no Oriente, dizerem dos portugueses que “A fortuna do Mundo é serem eles tão poucos, porque a natureza, como aos leões, felizmente os fez raros”. [1] 

Por isso nunca os europeus e a maioria dos povos nos compreenderão (ou perdoará), embora nos devam respeitar. E nós devemos exigir esse respeito.

Estamos pois, a anos-luz do “multiculturalismo” em voga no mundo ocidental, no após IIGM e que agora começa a revelar-se, na sua plenitude, um descalabro mentiroso.

Por complexas e estranhas metamorfoses da “maneira portuguesa de estar no mundo”, MM amalgamou-se, como a maioria dos seus conterrâneos, a esse ideário e tornou-se um combatente de elite, que lutou à sombra da Bandeira das Quinas.

Quinas essas, que são o símbolo maior da bandeira e da Pátria, pois nela se conservam desde a Batalha de Ourique, em 1139!

“Pai foste cavaleiro. Hoje a vigília é nossa”.

Assim escreveu Fernando Pessoa, o português mais misterioso e complexo que existiu até à presente época!

O pai era Afonso Henriques e é a nós que cabe, hoje, a vigília.

Marcelino da Mata com familiares
Marcelino da Mata, nascido a 7 de Maio de 1940, em Bula, Guiné Portuguesa, foi um grande combatente, porque se manteve íntegro e focado na sua missão.

Teve a audácia e a serenidade nos momentos críticos e foi competente, pois seguiu – mesmo sem o saber – o ensinamento desse grande cabo – de - guerra que foi o General George Patton, numa das suas frases mais célebres: “A verdadeira missão de um militar não é morrer pela sua Pátria, mas fazer com que o soldado inimigo morra pela Pátria dele”.

Acresce que, a maioria dos inimigos tinham a mesma Pátria, eram apenas renegados.

MM não renegou, não desertou nem traiu, ao contrário de alguns – felizmente uma minoria – que o fizeram e que um povo confuso e desnorteado por lideranças políticas fracas, erradas e incultas, tem deixado alcandorar a funções, prebendas e pedestais que não merecem e a que não têm direito e são o opróbrio e a cruz, das almas nobres e honestas e dos bons portugueses.

A Cristiano Ronaldo deram-lhe duas “botas de ouro”, por conseguir com mestria, meter uma bola, frequentemente, em balizas adversárias, num desporto chamado futebol.

Por tal facto é conhecido em todo o mundo e, sendo ainda novo, tem-se revelado um rapaz atinado e não fez ainda nada que nos envergonhasse.

Devemos estar muito contentes com isso.

Mas Marcelino da Mata foi ferido em combate, várias vezes, participou em 2412 operações de “Comandos” – tropa de excepcional valor, a que pertencia – e nelas praticou muitos actos de bravura e heroísmo, que lhe valeram, entre outras, cinco cruzes de guerra e ser, desde 1969, Cavaleiro da Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, da Lealdade e do Mérito.

Com isto ganhou jus a ser o militar mais condecorado na História do Exército Português.

Sem qualquer desprimor, creio bem, que este palmarés vale mais do que todas as botas de vil metal, que se possam ganhar na vida…

Mas MM vive humildemente e sem alardes – como é próprio das almas nobres – no seu canto do Concelho de Sintra, esquecido dos seus compatriotas. [2]

Eu como cidadão e oficial da Força Aérea quero testemunhar o meu respeito e admiração por tão singular soldado; orgulhar-me de ser um dos nossos e, como português, agradecer-lhe do fundo do coração.

E a melhor homenagem que lhe podemos fazer é comprometer-nos a tentar igualá-lo, alguma vez mais, que o que resta da Pátria Portuguesa seja ameaçada seja por quem for.

Recordo ainda D. Francisco de Almeida: “Se Deus fala português, não sei; estes canhões falam”.

Lembro D. João de Castro, a seu filho enviado em socorro de Diu: “Pelo que toca à nossa pessoa não fico em cuidado, porque por cada pedra daquela fortaleza arriscarei um filho; Eu vos ponho no caminho da Honra, em vós está agora ganhá-la”.

Cito Fernão Mendes Pinto, descrevendo um ataque a um barco de piratas chineses: ”E com muitos Padres-Nossos e pelouros, a eles nos fomos, e matámo-los a todos num credo”.

Mais recentemente Cunha Aragão, Comandante do NRP Afonso de Albuquerque, após gravemente ferido, no meio do combate, em 18/1/61, para os seus homens: ”Eu já estou, o Imediato que assuma o comando, não se rendam”.

Porque é que todos estes nossos compatriotas se comportavam assim e tal foi recorrente nos últimos nove séculos?

O grande poeta Rodrigo Emílio explica-nos no seu “Edital do Poeta às Portas da Morte”:

É preciso que se saiba porque morro.

É preciso que se saiba quem me mata.

É preciso que se saiba

que no forro desta angústia

é da Pátria tão-somente que se trata.

Caros compatriotas aqui presentes, tenhamos esperança (embora seja necessário contribuir para a Esperança…). Nesta semana apesar de, durante décadas, termos escutado em abundância, o elogio da cobardia; o escárnio da virtude; a elegia do vício e a defesa do relativismo dos Princípios é encorajador ver esta homenagem, a qual foi antecedida por uma outra, no dia 22 de Julho, ao heroico Subchefe Aniceto do Rosário, a que se associou a PSP e a Liga dos Combatentes (LC), morto na defesa do enclave de Dadrá, India Portuguesa, em 1954.

Aniceto do Rosário
Cerimónia, por sua vez, antecedida, no dia 13 do mesmo mês, pela inauguração de um singelo monumento evocativo dos mortos da freguesia de Sezures, no Portugal profundo, do Distrito de Viseu, iniciativa do Major General Campos de Almeida – colega de escola dos rapazes caídos no cumprimento do Dever – a que se associou a Junta de Freguesia, a Liga dos Combatentes e o Exército Português.

Mortos da Freguesia de Sezures.
Soldado Pedro Augusto - Guiné 25/11/1967
PCb José de Aguiar - Angola 11/7/1969
Temos assim uma homenagem àquele que foi o primeiro a tombar nesta campanha – Aniceto do Rosário – e um dos últimos a sobreviver – Marcelino da Mata – no mesmo conflito, passando por todos aqueles, desconhecidos, que verteram o seu sangue em nome da nossa existência colectiva.

Foram duas boas semanas e nada disto, à “boa” maneira portuguesa, foi planeado. Simplesmente aconteceu. [3]

Longa vida a Marcelino da Mata,

Abaixo os poltrões,

Vivam os heróis nacionais e, com eles,

Viva Portugal!

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[1] Gaspar Correia, “Lendas da India”.
[2] Alguns dos quais fizeram a vilania de o prender e torturar num quartel, nos idos de 1975!
[3] Mas, para quando a homenagem nacional que tanto Marcelino da Mata e alguns outros merecem?