segunda-feira, 30 de junho de 2014

A PRESTAÇÃO FUTEBOLÍSTICA NACIONAL

“As regras rigorosas da disciplina militar são necessárias para proteger o Exército contra as derrotas, contra a carnagem e, acima de tudo, contra a desonra”.
Napoleão

O treinador Jorge Jesus dizia, numa das últimas (muitas) conferências de imprensa a que nos habituou e nos diverte – não tanto por culpa dele, mas de quem lhe põe um microfone à frente – que toda a gente fala de futebol, mesmo sem ter qualquer crédito para tal.
Tem razão o homem, sendo tal razão escorada ainda no facto de nunca o termos ouvido falar a não ser nesse âmbito.
Marcaria mais pontos, todavia, se tivesse afirmado que o importante para o desporto conhecido por futebol (“football”, no original) era ter, e ver as pessoas a praticá-lo, em vez de se especializarem em treinadores de bancada; e já há muito, também, proliferam os comentadores, “noblesse oblige”!
Nós vamos seguir o seu conselho e não vamos discutir o que se passou dentro das quatro linhas.
Por isso vamos deixar os critérios sobre a escolha dos selecionados - a forma física dos mesmos e suas causas; o ambiente do balneário; as tácticas; a questão de se ter ou não, 10 jogadores a jogar em função de um, ou se temos uma equipa de 11 em que pode haver alguns que se destacam pela qualidade; as amizades ou inimizades que se vão desenvolvendo ao longo dos anos; se ter ido fazer jogos de preparação, aos EUA, era escusado; se o local de concentração no Brasil, foi o melhor; se foi adequada a mentalização da equipa, (isto é, o seu moral); se foi pensada a renovação da equipa atempadamente, etc. - dizíamos, a quem de direito.
Ou seja à Federação Portuguesa de Futebol e a quem mais possa ter responsabilidades neste âmbito.
O que se passou nem sequer foi mau de mais. Foi apenas a verdade que veio ao de cima.
Aguardamos, pois, em jubilosa esperança, que as “análises” e as “conclusões”, seguidas das “acções correctivas”, que sempre se prometem nestas alturas, não sigam o mesmo trilho do anterior, ou seja que não se ponha o dedo nas feridas e se ataquem as causas dos males que nos afligem, de que tem resultado nada se emendar.
O que tem obstado, até hoje, a que a equipa que representa a Bandeira das Quinas tenha ganho um título europeu ou mundial.
E das vezes que nos apuramos, tal aconteça sempre à última da hora, com mil peripécias pelo caminho e à custa dos “playoffs”!
Ou seja, afinal não se aprende nada…
E contra factos não há argumentos, apenas demagogia.
Ora a não ser que estejamos errados, as verdadeiras causas de ficarmos quase sempre curtos em desempenho, encontram-se à “anteriore” do que se passa nos relvados e para lá do que é estritamente futebol.
Sejamos claros, o futebol que não devia ser mais do que um desporto, passou a ser, sobretudo, um negócio e um palco para promover egos que despontam.
Sendo assim o mundo da bola está exposto e sujeito aos males da natureza humana e logo a um dos seus piores atributos: a cobiça. A cobiça é geratriz de corrupção e maus costumes.
Gera-se uma consequência de peso: como o futebol tem projecção mediática e cai no goto da maioria das pessoas, logo tem importância política…
Daí aquilo que se convencionou chamar de promiscuidade entre política e futebol.
O negócio – que passou a ter expressão quase global (até já chegou aos EUA que eram uns analfabetos futebolísticos e ignoravam semelhante jogo tido por “europeu”…) – passa pela compra e venda de jogadores, que é uma actividade de clubes e intermediários (uma espécie de mercado de escravos moderno); direitos de transmissão televisivos e por uma orquestradíssima campanha mediática de propaganda de marcas.

Ganhou, entretanto, direitos de “VIP” com galas para os melhores disto e daquilo.
Ora, em Portugal, tudo corre mal desde o princípio.
E o princípio é não se ter desporto escolar e verdadeiras escolas nos clubes.
Ter desporto escolar – desde a escola primária até à universidade – é uma responsabilidade não só dos privados mas, sobretudo, do Estado. E não falamos só de futebol, mas de todos os desportos. Isto deve ser a base de tudo.
Acontece que a juventude anda, simplesmente, por aí.
Depois temos as escolas dos clubes, que são responsabilidade destes e da respectiva federação. Mas como o negócio e a pressão da massa associativa (fora as campanhas eleitorais dentro dos principais clubes), agora com secções algo turbamultas, conhecidas como “claques” – que obrigam às “caixas policiais” e outras medidas de segurança impensáveis em terra de gente civilizada – opta-se por soluções que possam dar resultados imediatos.
Assim contrata-se “especialistas” conhecidos por “olheiros” que andam por esse mundo fora a tentar descobrir génios que possam ser transacionáveis.
As escolas, que levam tempo a produzir efeitos, passam a ser uma espécie de laboratórios de investimento para jogadores, cuja maioria nem chega a sê-lo, repletas não de portugueses, mas sim de pretinhos que se vão pescar por essa África, sobretudo naquela em que ainda se fala português. Quem não prova ou não tem sorte, porém, fica por aí abandonado pelos cantos…
E, então, não é mais fácil ir à América do Sul e Central adquirir um produto já acabado, tentar melhorá-lo e depois revendê-lo?
No topo de tudo isto ainda existe um Comité Olímpico, que não trata de futebol e que se deve ver da cor dos gatos para conseguir meia dúzia de atletas para apresentar nos jogos inventados pelos antigos gregos…
Como se tudo isto já não bastasse a preparação da “molhada” que se pretende transformar na lusa equipa passa a sofrer dos mais finos defeitos dos “Tugas”.
Em vez de criteriosa escolha de técnicos e jogadores por gente com créditos firmados e de, a partir daí, se estabelecer um plano (falam em estratégia, mas não sabem o que tal significa), e se começar a trabalhar com afinco, disciplina e método, passa-se a vida a dar entrevistas e a discutir tudo na praça pública, escorregando, por norma, tudo o que é importante fazer para a última hora.
E, de há muitos anos a esta parte, ninguém se pode desculpar com falta de meios: a selecção tem tratamento de príncipes!
Os ordenados que se pagam, neste âmbito, são moralmente pornográficos. E têm outro contra, juntamente com a luz da ribalta que se dá aos protagonistas do chuto na bola: deslumbra-os.
As excepções são poucas.
Os jogadores de futebol (e não só os jogadores) são, na sua maioria, gente simples com pouca instrução. Basta ouvi-los falar cinco minutos para se perceber as suas dificuldades em se exprimirem em português escorreito e em articularem frases com sujeito, predicado e complemento directo.
O estatuto que lhes atribuem, apenas comparados às estrelas de rock, naturalmente desequilibra-os. A sua imagem de marca passa pelos penteados “à índio”, tatuagens, brinco na orelha e boné à banda. Digamos que são extravagâncias identitárias que, em si, nada têm de mal, mas que os situam na sua verdadeira grandeza.
Para “heróis nacionais” estamos conversados.
A Comunicação Social faz o resto, massacra-nos com reportagens de tudo e mais alguma coisa. Horas a fio.
Temos que saber o que vestem; o que fazem; o que pensam; o que comem; para onde vão de férias; a cor do soutien da namorada; brindam-nos com grandes planos da Jante dos pneus do mister, etc.
Enfim, quando se aproxima o início de um campeonato, entra-se no campo do histerismo e do patrioteirismo que se substitui ao Patriotismo – que deve ser de todos os dias – onde as cores nacionais passam a ser confundidas com um trapo de enfeite. E onde se substituiu o “A eles como Santiago aos Mouros”, pelo “até os comemos”…
Pelo menos convém não confundir um campo de batalha com um campo de futebol que, repito, é apenas um desporto…
Mas os “média” e quem neles intervém, fazem pior: criam falsas expectativas; semeiam a confusão; provocam estados de euforia e depressão. As pessoas reagem em conformidade, tornam-se irracionais; esperam um milagre e a chegada de outro D. Sebastião, no meio da bruma, de espada em punho (ou de bola nos pés)!
Esquecemo-nos constantemente que somos poucos – logo não há muito por onde escolher – que temos que apostar na qualidade e que tal dá trabalho e implica escolhas; que é necessário organização, disciplina e persistência – de que somos relapsos – e de deixarmos de ter a “esperteza saloia” como topo de virtudes, mas antes apostar na inteligência empreendedora.
Todavia, enquanto não soubermos escolher a liderança para nos governar e o modelo político que a enforme, não sairemos da cepa torta.
Se o País está no estado em que está, porque é que o mundo do futebol haveria de gozar de saúde e boas práticas, que são o esteio dos bons resultados?
Se por acaso defendêssemos que só os jogadores que jogassem em Portugal pudessem representar o País, na seleção, o que diriam? Se a seleção é nacional, porque é que o treinador e a equipa técnica não têm que o ser? Porque é que os jogadores que praticam faltas disciplinares graves, não são mandados regressar imediatamente e irradiados da seleção?
Porque é que os jogadores têm que receber prémios por cumprirem o que se espera deles? Nesse caso passam a pagar quando perdem?
Pois é, caros leitores, nada disto é politicamente correcto.
O que parece correcto – mas apenas parece – é o facto das mais altas instâncias do Estado, mesmo antes de a selecção ter feito algo que a distinga – virem, céleres, convoca-la para uma fotografia de família, em vez de, simplesmente lhes enviarem um telegrama dizendo:
”Vão e cumpram a vossa missão. E não voltem sem terem transpirado tudo o que têm para transpirar, da cabeça para baixo. Essa, a cabeça, deve manter-se fria e focada.
É o mínimo que podem fazer pelos palermas que ficam aqui a torcer por vós!
Não se exige que ganhem – mas se ganharem melhor – apenas que não tornem o espectáculo penoso de ver, ao ponto de se envergonharem e a todos nós, por via disso. Boa sorte.”
É aqui que entra a disciplina de que falava Napoleão, o mesmo que tentava escolher os Marechais de França, apenas entre aqueles que tinham sorte.
Como se sabe, mesmo assim, ganhou muitas batalhas, mas acabou por perder a guerra.

5 comentários:

Joaquim Moreira disse...

Saudações!

Apoiado!
E eu que julgava estar sozinho nesta linha de pensamento, nada mais do que a realidade.

Joaquim Moreira

PSC disse...

MUITO BEM! Finalmente alguém põe "os pontos nos i's" sobre esta "marmelada" em que se transformou o futebol! Parabéns! E que não lhe falte a inteligência e a inspiração para continuar os seus magníficos "post's" em defesa de Portugal e dos Portugueses.

M.Senos Oliveira disse...

Caro Amigo,
Os teus escritos trazem-me, reiteradamente, à memória o "moto" da extinta BA3:"...res non verba". No entanto, como as frentes são tantas, só lembro, também, o velho general da Antiguidade que dizia" melhor: morreremos à sombra!!!" Isto já lá não vai de maneira nenhuma. E o dramático é que tenho Netos a crescer.
Abraço,
Manuel Senos Oliveira

Ricardo disse...

"Isto já lá não vai de maneira nenhuma."Foi para este objectivo final(a total descrença dos povos,neste caso do povo tuga,ou a parte do povo que ainda se identifica com a nação)que trabalharam todos os agentes do globalismo actual.Pior que todas as crises é a ideia de que nada já tem solução se instalar nos espiritos,e "eles" sabem muito bem isso.O capital não tem pátria(assim como não tem pátria o marxismo e afins)e a descrença também não,assim juntando a desmoralização de uma parte da nação com a outra parte "aburguesada" e adaptada ao globalismo merkantil podemos(qual fatalidade) adivinhar o fim da meada.A não ser claro que ainda haja quem consiga "cortar o fio" da meada.

Anónimo disse...

"RES NON VERBA"
Que alguém levante uma bandeira crível para refazer Portugal.
D. Pinto